[ Apresentação ] O caminho da Luz

Seus dedos cuidadosamente bailaram sobre os fios de cabelo castanhos, reunindo as madeixas soltas em um modesto coque. Ela trouxe da bolsa que pendia em seu ombro um boné, de cor cinzenta e frente branca, e o colocou na cabeça para atenuar os efeitos do sol. A cidade de Oshibana era muito menor que sua terra natal, com poucas avenidas e construções mais casuais que geralmente consistiam em residências ou mesmo comércios menores. No entanto, suas vielas estavam abarrotadas de barracas comercias dos mais variados tipos, distribuídas através das calçadas e estacionadas até mesmo sobre as ruas, de maneira que os visitantes transitavam como formigas através dos estabelecimentos. Luna estava um pouco apreensiva e considerou alugar um quarto para passar a noite, mas conhecendo a si mesma, imaginou que passaria a noite se torturando com os mais variados cenários que poderiam se suceder com o seu pedido. Ela estava prestes a dar um passo importante e pela primeira vez, seus pais estavam a milhas de distância. A Sede da Sabertooth ficava a algumas quadras dali e seu coração palpitava com mais afinco a cada passo que dava na direção do seu objetivo. Ela tinha vontade de rir com a mistura de sensações, mas ao mesmo tempo queria desistir e fugir de volta para sua casa. O que eu faço se eles me recusarem? Questionou a si mesma como sempre costumava fazer. A pergunta, entretanto, sumiu como fumaça quando sua atenção se voltou para uma pequena estante comercial com sapinhos Gekota em exposição. Ela se espremeu através do povo até que finalmente estava diante da sua maior e mais fofa fraqueza.

—— Eles são originais? —— Perguntou para a vendedora, uma mulher ruiva que caminhava na casa dos 35 anos.

—— Tanto quanto qualquer coisa daqui, moça. —— Confessou a vendedora, surpresa com a inocência da pergunta. Estava em uma feira popular e a probabilidade de encontrar produtos originais beirava zero. Luna, embora uma adulta, tinha a tendência a cometer aquele tipo de gafe. Ela deu um giro sobre o seu próprio corpo e partiu, atravessando a multidão desorganizada e finalmente findando na avenida principal de Oshibana, de onde já era possível vislumbrar a grande sede da Guild. Colocou a mão sobre o peito, contou até dez e prendeu a respiração por alguns poucos instantes. Quando soltou, seu semblante era mais sério do que nunca e a coragem parecia ter sido forjada em fogo intenso. Ela partiu em passos firmes e decididos, desviando da maior quantidade de ombradas que foi possível e terminando seu caminho de frente para os portões fechados da Sabertooth. Deu uma vista de olhos através do ambiente, apercebendo-se da falta de pessoas naquela área. Seu dedo calmamente se esticou e o braço vacilou por um momento, mas logo foi sensato o bastante para apertar a campainha. Em seu pessoal, honestamente almejava ser aceita. Um desejo puro e simples que significava muito para ela.

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A passagem arqueada permanecia fechada e nenhuma alma viva transitava pelo jardim que separava o portão de entrada do prédio principal da guilda. Luna, que estava de frente para porta aguardando ser recepcionada, ouviu o distante som da campainha e concluiu que o aparato funcionava adequadamente. A Sabertooth era uma guilda famosa e constantemente servia de manchete para as notícias dos jornais. Era improvável que todos os seus membros estivessem em missão e a sede fosse abandonada aos corvos. Intrigada, a aspirante a maga foi atrevida o suficiente para dar um passo na direção do portão, atrelando seus dedos a suas grossas barras metálicas e curvando o corpo um pouco para que pudesse bisbilhotar além das janelas mais baixas. Daquela maneira ela vislumbrou, em uma janela sem cortinas, a silhueta embaçada de uma pessoa transitando de um lado para o outro. Seu semblante neutro tornou-se mais sério, quase zangada com a pouca consideração que seus veteranos tiveram com a sua pessoa. Ela franziu o cenho e cerrou os punhos, fitando por alguns poucos momentos o portão e o jardim que separavam-na de seu sonho.

—— Vocês vão me ouvir, isso eu prometo! —— Declarou, motivada a exceder um pouco os seus limites e recorrer a um método pouco louvável: uma invasão. Luna estudou as barras de ferro, reconhecendo de imediato que a sua densidade era muito elevada para que simplesmente cortasse através delas — na verdade, ela não tinha nem mesmo um utensílio capaz de cortar através daquilo. No entanto, a estrutura possuía um formado cruzado de barras na horizontal que se encontravam com as verticais, que embora fossem inúteis para a escalada completa devido ao formato da parte superior do portão, eram excelentes para ganhar alguma altura. —— Isso pode ser útil. —— Admitiu para si mesma e se pendurou sobre a grade, cuidadosamente apoiando o pé sobre as barras de maneira que conseguisse mais altura. Seu corpo não era muito forte, mas ela havia praticado entradas e movimentos furtivos durante um cursinho de verão em sua infância e era plenamente capaz de se segurar conforme abandonava a segurança do chão.

—— Eu preciso dar um jeito de chegar ali. —— Concluiu, reconhecendo uma pequena deformação no muro de pedra que poderia servir como uma potencial pedra de escalada que muito provavelmente seria suficiente para que rolasse através do muro e caísse na grama fofa do outro lado. Naquele momento, um sopro tenebroso soprou através da espinha de Luna. Será que eles vão me aceitar se eu invadir a sede deles? Questionou-se, um pouco receosa e levemente arrependida. No entanto, havia chegado até ali depois de tantas noites sonhando e planejando sua carreira como maga, de forma que não se renderia na primeira dificuldade. Respirou fundo e flexionou os joelhos quando já estava na extremidade direita do portão, se atirando para o mesmo lado e jogando as duas mãos para frente. A pedra parecia bem presa e fora suficiente para suportar o seu peso, mas assim que o corpo se pendurou, seu peso foi duramente distribuído através dos dedos das mãos. Concomitante a empurrar o braço direito para cima e ganhar mais segurança — em troca de uma pressão dolorosa no músculo —, Luna esticou o canhoto e finalmente foi capaz de apoiar-se no topo do muro. Dali em diante a única coisa que teve de fazer foi distribuir o peso entre os dois braços e por fim, ganhar coragem o suficiente para que o destro também se segurasse no topo. A perna esquerda subiu e por fim, a perna destra também, de maneira que ela descansou ali mesmo, respirando de forma ofegante.

—— Deu certo. —— Sorriu, contente com seu próprio esforço e êxito. Despencar do muro para o lado de dentro era muito mais fácil do que escalar aquilo. Seus ombros e braços desceram com o impacto, mas não doíam nem um pouco. A partir daquele momento, esperava que só tivesse de seguir a diante.

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O burburinho dentro da mansão tornou-se audível a medida que seus passos deixavam-na mais próxima da entrada. Luna tirou o seu boné e o guardou dentro da bolsa, certa de que deveria demonstrar respeito perante os novos companheiros de guilda. No entanto, o descaso que tiveram com a sua pessoa ainda não havia sido esquecido, de maneira que seu caminhar era intenso e seus punhos fechados exalavam a seriedade de sua postura. Ela não percebeu que havia uma trilha de terreno rochoso para seguir até a entrada e atravessou uma parcela do jardim até chegar na entrada principal. Naquele momento olhou sobre o ombro e deu uma ultima olhada para o portão. Sua confiança fora construída com carinho e atenção pelos seus pais, mas a força de vontade era uma essência natural do seu ser, de maneira que estava determinada a provar a toda a Sabertooth que era digna de ser um dos seus membros. Ela ergueu a destra e deu bateu três vezes contra a porta, com as mãos abertas para que o som ecoasse dentro da casa e chamasse a atenção de todos os presentes.

—— Sabertooth! —— Bradou, colocando a força de vontade em sua voz, tornando-a mais intensa e digna de ser ouvida até o fim. Por um pequeno instante ela se silenciou, mas retomou o ímpeto e decidiu continuar com o discurso. —— Eu me chamo Luna Stormbreaker e vim para me tornar um membro da guilda. Eu posso ficar aqui por quanto tempo a sua paciência durar ou vocês podem abrir a porta e me aceitar como um membro. —— Terminada a sua declaração, ela deu um passo para trás para o caso da porta vir a se abrir e cruzou os braços, certa de tinha sido ouvida. Havia se esquecido do fato da guilda ter grande prestígio por possuir magos poderosíssimos mas estava certa de que uma declaração direta como aquela não seria ignorada. Uma manobra arriscada, que deixou-lhe levemente insegura, mas que fora necessário para atrair a atenção necessária.

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Uma sombra precipitou-se sobre a sua retaguarda, tão ligeira que a aspirante a maga só notou o advento da presença quando o braço se projetou próximo ao seu, igualmente encostado na porta. Luna deu uma vista de olhos sobre o ombro, identificando na silhueta misteriosa as características de um rapaz moderadamente esbelto. No entanto, seu semblante permaneceu inalterado, demonstrando a pouca paciência e o certo rancor que havia nutrido daquelas pessoas. Desejava com todo o seu coração provar o seu valor para a Sabertooth, mas jamais permitiria que eles pisassem no seu orgulho e esforço.

—— Sim, como acabei de dizer, eu sou uma maga. Venho para me tornar um membro da Sabertooth, mas aparentemente o seu grêmio é importante demais para aceitar novos membros, não? —— Disparou, embora sua voz estivesse inconscientemente mais suave por ter sido finalmente atendida. Ela não pretendia demonstrar grosseria alguma para com seus futuros companheiros, mas não admitiria mais desrespeitos desmedidos. Por fim, suspirou e tentou desmantelar o rancor, abraçando a calma mais uma vez.

—— Eu possuo uma magia que me permite aplicar propriedades das estrelas do cosmo em técnicas ofensivas, defensivas e de suporte. Infelizmente despertei minha magia recentemente e não possuo técnicas poderosas para demonstrar meu valor, mas tenho certeza que posso lhes provar que posso sim ser um membro da Sabertooth.

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O jovem tinha uma essência singular, como se o mistério se tornasse tangível e circundasse o seu corpo. Luna se questionou por um momento: teriam todos os demais membros teriam aquela aura intensa ou o homem a sua frente era algum tipo de figura especial dentre eles? De qualquer maneira, o convite foi tão surpreendente que ela empurrou seus pensamentos para os confins de sua psique e entregou-lhe um olhar incrédulo, tomando-o como um tolo. Ela refletiu um pouco a respeito conforme a distância entre eles tornava-se gradativamente maior e por fim, chegou a conclusão de que não haveria o que questionar uma vez que se tratava de um teste.

—— Muito bem, espero que não guarde rancor depois disso. Não vai ser uma experiência agradável. —— A maga se importava com o desconhecido e já havia comprovado o potencial destrutivo de seu poder mágico, de maneira que era arriscado utiliza-lo de maneira tão direta contra uma outra pessoa. Mesmo assim, ela manteve seus olhos focados nele, como uma presa se preparando para o abate, e concentrou uma parcela da sua energia mágica no punho. O poder surgiu sob a forma de pequenas esferas cintilantes aparentemente inofensivas circundando a mão destra, mas imediatamente mesclou-se a ela e começou a brilhar de maneira mais intensa. Luna sentiu o desgaste físico de utilizar aquele tipo de magia e pensou por um momento em parar por ali, mas julgou que era necessário continuar. Ela correu em direção ao rapaz e moveu o punho na mesma medida, mirando o centro do seu rosto. O punho mágico fora previamente envolvido em energia celestial e sua capacidade destrutiva certamente demonstrariam o nível de poder que a maga possuía naquele momento.

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O esplendor celestial se extinguiu completamente com um simples movimento. Luna, de olhos esbugalhados, meramente fitou o rapaz, incrédula pelo feito de força demonstrado. Desconcertada, a jovem limitou-se a esboçar um sorriso torto e reconhecer a sua fraqueza perante seus parceiros de grupo, embora estivesse convicta de que tornaria-se muito mais forte e superaria aquele homem e todos os outros. Ela acompanhou o rapaz para além da porta, correndo os olhos através dos membros dentro da guilda e mantendo a postura para não demonstrar a timidez de receber tantos olhares. Respirou fundo, cerrou os punhos e continuou em frente até ser questionada.

—— Na mão direita. —— Declarou, esticando a mão referida para que a magia se fizesse e o símbolo surgisse. Estava orgulhosa de si mesma, contente pelo primeiro passo dado rumo a um estilo de vida completamente novo.

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